quinta-feira, 21 de maio de 2020

Mulher será indenizada por falso positivo em exame de DST

Resultado mostrou que paciente gestante estava com sífilis

Defeito na prestação de serviço de clínica odontológica gera dever de indenizar
Créditos: Sebastian Duda / Shutterstock.com

O Município de Betim, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (MG), e um laboratório clínico deverão indenizar uma mulher em R$ 20.000,00 (vinte mil reais) por erro em exame médico. A paciente, que encontrava-se gestante, havia testado positivo para sífilis; mas, em exame de contraprova, foi constatado que ela nunca teve contato com a bactéria Treponema pallidum, transmissora da doença.

A decisão é da Oitava Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), que manteve o valor da indenização a título de danos morais definido em primeiro grau.

A paciente afirmou que foi encaminhada para o Labclim Laboratório de Análises Clínicas, que presta serviços para a Prefeitura Municipal de Betim, para realizar exames do pré-natal. Ao retornar ao médico com o resultado dos exames, foi surpreendida com a notícia de que havia contraído sífilis, doença sexualmente transmissível (DST).

Ela disse, nos autos, que levou ao conhecimento de seu companheiro o resultado do exame, que sugeria uma provável infidelidade. Tal fato provocou brigas e discussões frequentes entre o casal, culminando no término do relacionamento.

Ademais, por orientação médica, a paciente foi submetida ao tratamento da doença, que é realizado com o antibiótico penicilina benzatina, que provoca diversos efeitos colaterais, como erupções cutâneas e urticária.

Algumas semanas depois do primeiro exame, a mulher teve que retornar ao laboratório para realizar uma contraprova, sendo informada de que não havia sido contaminada por sífilis. Inconformada por ter sofrido constrangimento e estresse, requereu indenização a título de danos morais.

Sentença

O juiz de direito da 1ª Vara Cível da Comarca de Betim, Adalberto José Rodrigues Filho, estipulou o pagamento da indenização por danos morais em R$ 20.000,00 (vinte mil reais).

A quantia seria paga solidariamente pelo laboratório e pelo Município de Betim, uma vez que a responsabilidade clínica cabe ao ente público, que tem o dever de ofertar o serviço, e ao ente privado, que foi contratado para prestar o serviço de saúde com eficiência.

O laboratório apresentou defesa, afirmando que o médico não poderia ter fechado o diagnóstico sem um novo exame. Sustentou que, segundo determina o Ministério da Saúde, é necessário repetir o exame com o intervalo de 30 dias para realização de contraprova.

Município

O Município de Betim alegou que firmou contrato de prestação de serviço com a Labclim, responsável direta por quaisquer perdas, danos ou prejuízos ocasionados ao contratante e a terceiros. Enfatizou a ausência de comportamento omissivo por parte da equipe de saúde do município, destacando que não se pode falar em responsabilidade objetiva por parte da prefeitura.

Por derradeiro concluiu que o município somente contratou a empresa para realizar o exame, inclusive para que não houvesse falta do serviço, não podendo ser responsabilizado pelos atos do laboratório. E pugnou que fosse retirada sua responsabilidade solidária pelos danos morais.

Paciente

A mulher interpôs recurso adesivo, afirmando que o valor indenizatório determinado na sentença se revelava irrisório, ainda mais ao se considerar que a Labclim tem reincidência em atestar erroneamente os seus exames.

A paciente pediu o aumento da indenização por danos morais para 93 salários mínimos, sustentando que a empresa e o município precisariam de uma condenação bastante elevada para evitar outras situações semelhantes.

Decisão

A relatora do recurso, desembargadora Ângela de Lourdes Rodrigues, manteve integralmente a sentença. Acompanharam o voto o desembargador Carlos Roberto de Faria e o juiz convocado Fábio Torres de Sousa.

(Com informações do Tribunal de Justiça de Minas Gerais – TJMG)

EMENTA:

APELAÇÕES CÍVEIS – INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – PRELIMINARES – ILEGITIMIDADE PASSIVA – REJEIÇÃO – CONTRARRAZÕES – PEDIDO SUBSIDIÁRIO DE REDUÇÃO DO VALOR INDENIZATÓRIO – INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA – MÉRITO – EXAMES LABORATORIAIS – GESTANTE – FALSO POSITIVO DE SÍFILIS – ÍNICIO DESNECESSÁRIO DE TRATAMENTO – DESÍDIA DO CORPO MÉDICO – CONSTATAÇÃO – LESÕES EXTRAPATRIMONIAIS – PRESENÇA – VALOR INDENIZATÓRIO – RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE – AMPLIAÇÃO – IMPOSSIBILIDADE – CONSECTÁRIOS LEGAIS – ALTERAÇÃO DE OFÍCIO – CABIMENTO – CONDENAÇÃO SOLIDÁRIA IMPOSTA A ENTE MUNICIPAL – REGRAMENTO – TEMA 810 DO STF – OBSERVÂNCIA.
-O Município de Betim detém legitimidade para figurar no polo passivo de ação na qual uma munícipe alega ter sofrido danos morais em razão de falha em diagnóstico médico por pessoa jurídica de direito privado que presta serviços à dita Municipalidade.
-A cláusula de não indenizar firmada em contrato celebrado entre pessoas jurídicas de direito público e privado não pode ser invocada para restringir ou afastar direitos de quem sequer participou da avença, já que não possui eficácia plena contra terceiros.
-“As contrarrazões são cabíveis apenas para impugnar os fundamentos de eventual recurso interposto, com o intuito de manutenção da decisão exarada, mostrando-se via inadequada para suscitar pedidos de reforma de decisão, consoante os princípios da non reformatio in pejus e do tantum devolutum quantum appellatum” (EDcl no REsp 1.584.898/PE, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 02/08/2016, DJe de 10/08/2016).
-A emissão de laudo positivo de infecção sexualmente transmissível, repetido e confirmado, ainda que com a ressalva de que poderia ser necessário exame complementar, causa inegáveis sofrimentos ao paciente. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça.
-Deve ser afastada a alegação do apelante principal de que o tratamento iniciado para o tratamento de sífilis em relaç ão à gestante teria caráter meramente preventivo quando os elementos de convicção retratam que a equipe médica que acompanhava a paciente tardou a requisitar exame para fins de contraprova.
-Restam caracterizados os danos morais quando a paciente sofre estresse e angústia por ter sido diagnosticada erroneamente com sífilis enquanto estava grávida, convivendo com o temor de que a sua saúde e do seu bebê fosse prejudicada.
-Afasta-se o pleito de ampliação do valor indenizatório quando este foi arbitrado na sentença em patamares condizentes com as peculiaridades do caso concreto, estando, inclusive, em montante superior ao que já foi concedido no âmbito deste Tribunal em casos similares.
-A alteração dos consectários legais, por versarem sobre matéria de ordem pública, pode ser ordenada de ofício, sem que isso configure ‘reformatio in pejus’.
-Em se tratando de condenação não tributária imposta solidariamente à Fazenda Pública impõe-se a observância dos índices e critérios delimitados pelos Tribunais Superiores, notadamente o regramento vinculante estabelecido pelo STF por ocasião do julgamento do Tema de Repercussão Geral de n°. 810 (RE 870.947/SE).
(TJMG –  Apelação Cível  1.0000.19.151461-1/001, Relator(a): Des.(a) Ângela de Lourdes Rodrigues , 8ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 02/05/2020, publicação da súmula em 07/05/2020)

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