Os carros de entrada são um produto em extinção. O avanço tecnológico dos veículos na última década decretou essa mudança. Independentemente do preço e da marca, os compradores de hoje, segundo especialistas, não querem mais modelos novos sem as últimas tecnologias.
O mais recente item da lista de desejos dos brasileiros é o câmbio automático. Porém há muitos outros equipamentos quase “obrigatórios. Como ar-condicionado e central multimídia.
“O mercado está pedindo os carros cada vez mais completos. Não é a montadora que decidiu vender os veículos mais equipados. É o consumidor que está exigindo esses conteúdos. Câmbio automático tem a demanda crescente porque é um conforto no trânsito”, explica o consultor da ADK Automotive, Paulo Garbossa.
Para Cassio Pagliarini, especialista da Bright Consulting, os carros pequenos são muito mais sensíveis ao acréscimo de tecnologia e custo. “Existe uma lógica inexorável que se repete. O cliente é o rei. E chega uma hora em que não vale a pena comprar um veículo de plataforma antiga. Quando eu estava na Hyundai, a chegada do HB20 transformou vários veículos em obsoletos”, recorda Pagliarini, que foi diretor de marketing da Hyundai Motor Brasil.
O novo básico
Até uma década atrás, o mercado brasileiro oferecia os chamados carros pelados. Eram as versões de entrada dos compactos sem ar-condicionado, direção hidráulica, som ou vidros e travas elétricos. Muitos eram vendidos em carrocerias de duas portas. ABS e airbags eram opcionais. Isso acabou.
“Nem para locadora estão conseguindo vender só o básico”, aponta Garbossa. “No meu tempo, bastava ter uma caneta para a puxar a fita cassete. Atualmente, as pessoas entram no carro e o streaming começa a tocar. É outra tecnologia e outro preço”, explica (com bom humor) o especialista da ADK.
Os novos carros de entrada já saem de fábrica com ABS e airbags frontais, direção elétrica, cintos de três pontos e ancoragem Isofix para cadeirinhas infantis. Porém, as versões mais vendidas são sempre as mais equipadas. “Há itens que é difícil não ter, como multimídia”, complementa Pagliarini.
Aumento de custos
Paralelamente aos desejos dos consumidores, houve a modernização dos projetos. A cada troca de geração, os carros precisam ser mais seguros e menos poluentes. Seja pela acirrada disputa entre as marcas, seja por força das novas exigências legais em vários países no mundo.
Isso explica um pouco a migração dos modelos de entrada para compactos modernos. Carros feitos sobre as novas plataformas modulares diluem custos e permitem oferecer mais recursos. Alguns sedãs e SUVs pequenos já trazem dispositivos como frenagem automática de emergência.
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“Na VW, buscam desenvolver o novo carro de entrada a partir da plataforma do Polo. PSA e FCA se uniram e terão a nova plataforma da PSA para pequenos. A Chevrolet passou a uma nova plataforma. Na Toyota, o cliente vai preferir um Yaris de conteúdo reduzido a comprar um Etios”, analisa Pagliarini.
O saldo também precisa ser positivo para os cofres, ressalta Garbossa. Segundo o consultor da ADK, cada fabricante tem um custo fixo da operação que precisa ser pago no fim do mês.
“As montadoras hoje em dia estão partindo para o seguinte: todos os veículos têm de dar lucro. É preciso ter lucratividade. Com a pandemia, isso intensificou. A própria Ford tirou todos os sedãs de linha para focar em picapes e SUVs. Só mantiveram o Ka porque dá volume”, aponta.
Índia, o berço dos BRICS
As montadoras vêm desenvolvendo novas plataformas de baixo custo para atender aos requisitos globais de segurança e emissões. No caso da Índia, carros com menos de 4 metros pagam tarifa menor. É uma regra local que acabou por dar ao país o know-how para criar compactos baratos.
Na visão de Cassio Pagliarini, da Bright, é de lá que virão muitos dos próximos lançamentos do Brasil. Um desses modelos é o Nissan Magnite, um inédito SUV compacto feito sobre plataforma derivada do Renault Kwid. O “mini Kicks” deve ser fabricado em Resende (RJ) até 2022.
“A Índia é a melhor fonte de desenvolvimento para veículos acessíveis. De lá saíram os modelos da Ford (linha Ka), da Renault (Kwid) e deverão sair da PSA (Peugeot Citroën). Conseguem criar arquiteturas mais eficientes com a aplicação dos novos requisitos de emissões, segurança e eficiência energética. Mesmo assim, serão veículos mais caros”, conclui Pagliarini.
Imposto é vilão no preço segundo as marcas
Com mais tecnologia, é natural que o preço se eleve. Porém, em outros mercados os carros também são modernos e não custam tanto. Os clientes reclamam dos preços às montadoras, que se defendem sempre com o argumento do “Custo Brasil”, que inclui impostos de mais de 50% sobre os veículos. Enquanto que a mesma tarifa é de 7% nos Estados Unidos, 14% na Europa e 16% no México. “Nosso sistema tributário, que foi construído nos últimos 50 anos, é caótico e muito alto. É preciso simplificar e reformar para nos deixar mais competitivos com o resto do mundo”, afirma o presidente da Anfavea, que reúne os fabricantes de veículos do País, Luiz Carlos Moraes.
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