PL das Fake News: contexto da Lei de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet
No último mês, várias mudanças agitaram o cenário jurídico brasileiro. Entre elas, projetos de lei bastante polêmicos. E dessa maneira, impossível não comentar sobre o PL das Fake News – ou a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet, trazida pelo PL 2630/2020.
As polêmicas envolvem desde o processo de aprovação da legislação – a qual foi proposta pelo Senado, modificada na Câmara dos Deputados e aguarda novas alterações/modificações, como alguns já prevêem – até o próprio texto do projeto de lei, já que parece, em alguns pontos, se contrapor às disposição da ainda não integralmente vigente Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
Ainda que o projeto afirme seguir na mesma linha da LGPD e do Marco Civil da Internet, é inegável as controvérsias geradas, sobretudo, pelas suas modificações. Afinal, a cada etapa pela qual ele passa parece ser modificado de maneira profunda. Ao mesmo tempo, contudo, é projeto que pretende se antecipar às eleições de 2020 justamente para evitar as polêmicas das eleições de 2018 sobre as fake news.
De todo modo, parece que, em breve, finalmente será aprovado – se não houver veto da presidência. E para isso, indispensável a análise do PL das fake news à luz de seu contexto.
O que é o PL das Fake News
Antes de tudo, é preciso entender o objeto do PL 2630/2020, para, então, diferenciá-lo das legislações anteriores e debater seus dispositivos mais polêmicos.
O PL das Fake News (PL 2630/2020) é o projeto de lei que institui a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet, tal qual dispõe sua ementa. Dessa maneira, visa regulamentar a veiculação de informação e “desinformação” (nome legal utilizado para tratar as fake news) sobretudo em redes sociais e serviços de mensagem privados – ou seja, não comenta também sobre a veiculação de desinformação por órgãos públicos. O objetivo, portanto, é impedir a veiculação de notícias falas em ampla escala.
O artigo 1º da antiga versão do PL 2630/2020 dispunha que:
Art. 1º Esta lei estabelece normas, diretrizes e mecanismos de transparência de redes sociais e de serviços de mensagem privada através da internet, para desestimular o seu abuso ou manipulação com potencial de dar causa a danos individuais ou coletivos (Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet)
Após mudanças, no entanto, a redação do art. 1º passou a dispor que:
Esta Lei, denominada Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e
Transparência na Internet, estabelece normas, diretrizes e mecanismos de transparência para provedores de redes sociais e de serviços de mensageria privada a fim de garantir segurança e ampla liberdade de expressão, comunicação e manifestação do pensamento.
Ocorre que, como será visto, o projeto de lei, ao mesmo tempo em que legisla sobre a liberdade na internet, impõe medidas que, para responsabilização, colocam em risco também a liberdade de expressão. E alguns chegam a comentar em eventual censura do Legislador, não obstante a aparente violação à proteção dos dados pessoais prezada pela LGPD.
A quem se aplica a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet
Para entender a abrangência da Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet, proposta com o PL das Fake News, é preciso analisar, então, os parágrafos do atual art. 1º do projeto:
§ 1º Esta Lei não se aplica aos provedores de redes sociais e de serviços de mensageria privada que ofertem serviços ao público brasileiro com menos de 2.000.000 (dois milhões) de usuários registrados, para os quais as disposições desta Lei servirão de parâmetro para aplicação de programa de boas práticas, com vistas à adoção de medidas adequadas e proporcionais no combate ao comportamento inautêntico e na transparência sobre conteúdos pagos.
§ 2º O disposto no caput aplica-se, inclusive, aos provedores de redes sociais e de serviços de mensageria privada sediados no exterior, desde que ofertem serviço ao público brasileiro ou que pelo menos uma integrante do mesmo grupo econômico possua estabelecimento no Brasil.
Ou seja, a Lei da Transparência da Internet se aplicará a:
- serviços de mensagem e provedores de redes sociais privados (não os veículos públicos);
- com mais de 2 milhões de usuários;
- nacionais ou internacionais, desde que ofertem serviço em território nacional ou possuam estabelecimento no Brasil, ainda que de um integrante do grupo econômico.
Fake news ou desinformação: o objeto do PL 2630/2020
O conceito de fake news ou desinformação, como trazido pelo projeto, é apresentado no art. 4º do PL 2630/2020. Portanto, para fins legais, desinformação é
conteúdo, em parte ou no todo, inequivocamente falso ou enganoso,
passível de verificação, colocado fora de contexto, manipulado ou forjado, com potencial de causar danos individuais ou coletivos, ressalvado o ânimo humorístico ou de paródia.
A Lei de Transparência na Internet fere a LGPD?
A maior pergunta em torno do PL das Fake News é se o projeto de lei fere ou não as disposições da LGPD.
É sabido que, embora a proteção dos dados seja uma discussão de longa data, sobretudo no cenário internacional, ela enfrenta obstáculos no Brasil. A proteção por si não era desamparada tendo em vista as disposições do Código de Defesa do Consumidor (CDC) e do próprio Código Civil. Com o Marco Civil da Internet, no entanto, inicia-se um processo de adequação do Direito a uma nova realidade – mais virtualizada, com menos barreiras.
Em 2018, então, vem a publicação da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais – a qual, muito embora siga no caminho iniciado pelo Marco Civil, não se restringe ao cenário virtual. Pelo contrário, pretende proteger os dados de forma ampla, em meios offline ou online. Mas se a sua intenção é regular uma sociedade cada vez mais baseada em dados, encontra no Brasil a resistência para a sua aplicabilidade.
Logo após a sua publicação, uma alteração na data de vigência: de fevereiro de 2020, passa para agosto de 2020. Em 2020, a poucos mesos de iniciar sua vigência novas alterações: passa para maio e agosto de 2021, a depender do objeto.
E agora, por fim, um projeto de lei que parece se opor a todos os preceitos em prol da privacidade do indivíduo e de um direito considerado da personalidade.
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